Gajas ao Poder

Wednesday, February 28, 2007

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Era uma vez um sultão e uma menina que ele queria como sua ionésima esposa. E ela não tinha voto na matéria no que diz respeito ao desejo dele. Mas tinha todos os votos de que necessitava para contornar a indiferença e o esquecimento: o seu palavrar, a sua imaginação, o acender o desejo dele não por ela própria (isso seria demasiado fácil mas excessivamente transitório) mas por aquilo que ela fazia, aquilo que ela sabia, aquilo que ela imaginava, aquilo que ela lhe trazia como "valor acrescentado": as palavras, organizadas em frases, organizadas em histórias, organizadas ao longo de noites intermináveis, de que ele dependia cada vez mais. Que ele queria ouvir cada dia que passava. De que ele precisava como de pão para a boca. Que o levaram a não prescindir já dela, mesmo quando o desejo (por qualquer outra que não ela) tivesse já morrido.

Isto traz-me à memória uma outra história, a do Carteiro de Pablo Neruda. Lembram-se daquela página magnífica em que se acusa o pobre coitado de ter seduzido a moça com metáforas, senhores, com metáforas!...

As palavras são sensacionais. Assim também sejam sensacionais as ideias que elas transmitem.

Sunday, February 11, 2007

Tempo

O tempo é o que queremos fazer com ele.
Há muita gente que me diz "não sei como consegues ter tempo para tanta coisa... Dois empregos (agora são três), três filhos, dois cães, sem empregada, ..."
Tenho de vos participar uma coisa: o tempo é elástico.
Depende de como o usamos, ou de como dele prescindimos.

Regra nº 1: Atender primeiro ao importante e deixar o urgente para depois.
Às vezes queremos fazer tudo a tempo e horas e não chegamos a conseguir, enquanto deixamos para trás as coisas que são verdadeiramente imprtantes e a que não conseguimos deitar mão porque não tivemos tempo, estávamos demasiado ocupados com as coisas urgentes. A verdade é que as urgentes, se não forem feitas por nós, serão feitas por outrém; as importantes, se lhes não deitarmos mão, ninguém deitará.

Regra nº 2: Gozar o tempo de que verdadeiramente dispomos.
Quando fazemos as coisas com empenhamento, com seriedade, com coragem, elas saem-nos bem. Mesmo que o resultado não seja propriamente aquele que esperávamos. Se soubermos fruir do tempo que vai passando, não ficamos acabrunhados quando ele chega ao fim. Porque o gozámos. Porque tirámos partido dele. Porque ele nos pertenceu.

Regra nº 3: Nunca chorar sobre o leite derramado.
Amanhã é outro dia. Podemos sempre recomeçar. Aprendemos alguma coisa (espero!) com as asneiras que fizemos. E isso é uma coisa boa a tirar das coisas más. Entrar em parafuso porque não sabemos o que fazer é contraproducente: Gastamos-nos a andar em círculos, aí é que o tempo que passou não nos trouxe nenhuma mais-valia. E ainda continuamos a ter tudo por resolver.

Regra nº 4: Confiar no tempo.
E em nós. E naqueles que nos rodeiam. E nas coisas lindas de morrer que nos cercam. E nas lições que vamos aprendendo. E etc e tal. Porque as flores dão fruto. E semente. E as sementes germinam. E o ciclo recomeça. Mesmo sem nós. E só funcionarão de facto quando funcionarem sozinhas, já sem nós.

É por isso que a vida é tão bonita, e é por isso que a morte é tão bonita. Porque se completam, porque constituem um círculo perfeito, porque quando se fecha o círculo dá-se espaço a novas vidas.